Coisas de Portugal sem crianças

- 26.6.14

Portugal precisa de crianças.
Há muito que soou o alarme: não temos crianças para uma saudável renovação de gerações. Nascem cada vez menos bebés por ano e a pirâmide está irremediavelmente invertida, o que nos trará graves problemas de sustentabilidade do nosso modelo social a médio e longo prazo.
Portugal precisa urgentemente de crianças. Mas ainda assim muito pouco ou nada tem sido feito para resolver o problema. As famílias continuam sem dinheiro para ter filhos, sem ter tempo para ter filhos. As leis continuam a não favorecer (na maioria dos casos até dificultam) aqueles que abdicam do seu tempo e do seu dinheiro (para mantermos a visão materialista do sistema instalado) para criar uma nova geração que vai ser o futuro do país. Claro que os benefícios emocionais são muitos, mas eles são mesmo o que resta a uns poucos teimosos que ainda querem pôr filhos neste mundo e vê-los crescer...

Portugal precisa de crianças. Mas Portugal precisa de mudar e muito, se quer ter mais crianças. Precisa de olhar os pais como educares ao serviço do país e do mundo. Precisa de os incentivar a prosseguirem o seu trabalho e a darem o melhor de si. Financeiramente sim, também, mas o que os pais precisam, acima de tudo, é serem acarinhados e apoiados nas imensas responsabilidades que carregam às costas.
Portugal precisa de demonstrar aos pais que ainda não têm filhos que é uma imensa alegria conviver diariamente com uma criança. Que elas são o melhor do mundo e porquê. E garantir às futuras jovens mães e jovens pais que o país os ajudará nessa tarefa, dando-lhes condições para tal. Tornando essa experiência em algo maravilhosamente positivo, não num sacrifício desmesurado em prol de nada que o justifique.

Portugal precisa de crianças. Mas Portugal precisa também de acarinhar cada uma das crianças que nascem e dizer-lhe que ela vai ser um orgulhoso cidadão do seu país, no qual poderá crescer de forma segura e saudável, desenvolver os seus talentos e um dia coloca-los ao serviço de todos, beneficiando também do melhor que os outros adultos (ex-crianças) terão para lhe dar.
Portugal precisa de dizer às suas crianças que não vai simplesmente empurra-la de escola em escola, um dia inteiro, só porque os pais têm de sair de casa de manhã e chegar noite dentro para sobreviverem. Precisa de dizer às suas crianças que não vão andar de escola em escola anos e anos para depois não terem qualquer lugar na sociedade, porque não haverá emprego, não haverá lugar para as suas potencialidades (que entretanto nem tiveram oportunidade de desenvolver), não haverá futuro. Precisa de dizer às suas crianças que vale a pena nascer e crescer porque a vida é uma experiência maravilhosa, por mais que os seus pais e avós já não acreditem na vida, muito menos no país que os viu nascer.

Portugal precisa de crianças. Mas Portugal faz parte de um mundo e de um planeta esgotado, com excesso de população que consome, diariamente, os recursos da Terra sem qualquer sentido de responsabilidade. Por isso Portugal, se precisa de mais crianças, precisa também de reduzir o seu consumo energético per capita. Precisa de apostar nas energias renováveis e apelar a formas de vida menos consumistas, que contribuam para a sobrevivência do Planeta, lar de países como Portugal, lar de todos aqueles que nele habitam e todos aqueles que nele vierem a nascer.

Portugal precisa de crianças. Mas Portugal precisa sobretudo de crianças saudáveis. Por isso não pode continuar a permitir que todos os dias crianças consumam alimentos absolutamente nefastos para a sua saúde, que enchem as prateleiras de todos os supermercados, restaurantes e máquinas de consumo rápido, para proveito de umas quantas indústrias.
Portugal precisa de crianças. Mas nunca como hoje teve crianças a comer tão mal, que num futuro próximo serão adultos com problemas de saúde, diminuídos assim na sua capacidade produtiva, na sua vitalidade, na sua energia capaz de mudar o rumo do país e do mundo. Portugal, se quer ter mais crianças e crianças saudáveis, tem de apostar fortemente numa política de alimentação saudável que volte a valorizar os produtos que crescem nas nossas terras, nas nossas árvores, no nosso mar, em condições ambientais, elas próprias, saudáveis.

Portugal precisa de crianças. Mas precisa de olhar cada uma delas como um tesouro precioso, que já traz inscrito em si potencialidades imensas e únicas, que poderão vir a fazer toda a diferença no nosso mundo. Portugal precisa de pais que alimentem essas potencialidades com tempo, amor e paciência. E Portugal precisa de um sistema de ensino que puxe pelo melhor dessas crianças, não as coloque diariamente numa sala fechada com outras 30 crianças num ensino igual para todos, onde os professores são obrigados a dar programas extensíssimos e tantas vezes sem qualquer razão de ser, sem tempo para cuidar, com amor e paciência, de cada dos seus tesouros.
Portugal precisa de crianças. Mas de crianças que vivam a vida. Que trepem às árvores e experimentem aquilo que aprendem. Que aprendam a relacionar-se com os outros e a colaborarem com todos, complementando-se nas suas diferenças. Crianças que cresçam numa escola onde têm tempo para brincar. Onde as crianças não são esgotadas de forma a estarem absolutamente fartas da escola (esse que podia ser um lugar maravilhoso de conhecimento) aos 13 anos. Onde os professores sejam os seus grandes mestres, de conhecimentos específicos mas também da arte de viver, em vez de serem pessoas sacrificadas por um sistema que todos os dias os pressiona e descredibiliza.

Portugal precisa de crianças. Mas não basta ter crianças. Portugal precisa de mudar e mudar muito para receber essas crianças. Até porque, se Portugal não mudar o que tem de mudar as crianças não nascerão. As crianças não crescerão, pelo menos de forma saudável. As crianças não gostarão do país. As crianças fugirão do seu país. Em última instância, as crianças nem gostarão de viver, neste país ou noutro.

Portugal precisa de crianças. Mas as crianças precisam e muito que Portugal seja outro.

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