Hoje a tarde foi dedicada ao teatro. A ideia era fazer uma festa, mas quando apareci com as caixas da roupa de Carnaval, em vez de baile, tivemos esepectáculo. O Sebastião era o cowboy que conhecia a espanholita Nonoi e a pedia em casamento. Montados no cavalinho de pau, os dois passeavam-se pelo meio dos sofás, até que o tigre Dudu os assustava e perseguia pelo resto do quarto dos brinquedos.
O Afonso chegou entretanto do jogo de hóquei e rapidamente enfiou um fato de pirata para o episódio 2 da saga dos manos. Pois que o Sebastião e a Nonoi casaram entretanto, e a Nonoi até trocou a sua flor vermelha por um chapéu de cowboy. A lua de mel foi a bordo de um cruzeiro (barco de borracha insuflável). E tudo corria bem até que o cruzeiro foi atacado pelo terrível pirata dos mares Afonso. Sebastião, valente cowboy, começa a lutar com o pirata Afonso para defender a sua amada, e a luta só acaba porque, escondido na mala de viagem da Nonoi, ia o tigre Dudu, que assusta novamente toda a gente. Mas afinal ele só queria diversão (e até trocara a sua cabeça de tigre pela flor vermelha da Nonoi), por isso acabam todos contentes, a dançar ao som do CD da Leopoldina.
A mami filmava e fazia a narração possível dos acontecimentos. Daqui a uns anos, o que nos vamos rir a ver tanto disparate......
Dois gémeos a chorar ao meu colo. A Nonô com tosse e ataque de birra. O Dudu com febre e dores de barriga depois de ter vomitado umas poucas de vezes. Toca o telefone. Maristas.
- Sim? Não me dê nenhuma má notícia, por favor...
- O Afonso caiu na ginástica. Está consciente, mas tem um galo muito grande, e é melhor ser visto na clínica.
- O pai já vai buscá-lo. E ao Sebastião, não lhe aconteceu nada?
Estava tudo bem com ele. A vantagem de ter muitos filhos é que as nossas preocupações têm de dividir-se por muitos, por isso raramente são excessivas com algum deles. A desvantagem é que, a atenção que damos a cada um deles, nos seus acidentes de percurso, também são menores. E o Dudu foi para a cama com a pressa de todos os dias, entupido de xarope. A Nonô não teve direito a história e o Afonso, mesmo com galo, teve de fazer os trabalhos de casa para não deixar para o fim-de-semana. O Sebastião, hoje intocável, ainda está ao meu lado a fazer contas. E resmunga:
- Grande sorte, tiveram os manos! Já foram todos descansar...
(Sebastião, 6 anos, ao ver um moopie da capital da cultura)
- Olha, mãe! Está ali o Afonso Henriques.
- Boa, Sebastião. E ainda te lembras onde é que viste aquela estátua?
- Sim. Em Guimarães.
- Boa. E já sabes em que dia fazes anos?
- Claro, mami. A 29 de Setembro de 2005.
(Mãe espantada)
- Ó Sebastião... a mãe no verão disse-te tantas vezes estas coisas, e tu não conseguias decorar. Agora de repente sabes tudo! Como é que dantes tinhas memória de galinha, e agora tens memória de elefante?
(Sebastião ri. Depois fica pensativo)
- Ó mãe, é que eu dantes era pequeno, e agora sou crescido.

Pois é. Simples, não é, Sebastião? A mãe escusava de ter desesperado no verão, e devia ter percebido mais cedo que há alturas certas para aprender certas coisas, e alturas certas para crescer...
Temos um problema cá em casa. Um problema GRAVE! O meu pequeno Dudu resolveu ser do Benfica!
Medo. Pânico. Terror. Do papi, claro. A mami só tem de se rir às escondidas. É que ver um "caganito" de 2 anos a gritar pelo Benfica, quando toda a sua família é do Porto, e há cachecóis, equipamentos, cartões de sócio, etc, etc, etc, é mesmo ser do contra! Os irmãos desesperam a tentar convencê-lo. A Nonô (gémea) desespera-se porque, na sua cabecinha obcecadamente metódica, o irmão não pode ser de uma coisa diferente, sobretudo porque o pai fica triste. E o pai desespera-se porque... bem, vocês entendem porquê. Eu é que não, porque sofro daquela doença que às vezes ataca as mulheres, e que as faz pensar que é um profundo disparate sofrer tanto e gastar tanto dinheiro com simples jogadores que andam a correr atrás de bolas. Eu sei, eu sei... tenho este problema, talvez um dia me cure. Por enquanto, tenho de ir tentando convencer o Dudu a ser do Porto, e rir-me só às escondidas quando ele bate o pé e afirma, de peito cheio:
- Dudu Pôto, não. Dudu Benfica. Ben-fi-ca! Ben-fi-ca! Ben-fi-ca!
- Ó mami! Não consigo dormir! Tens de tirar aquele quadro da minha parede...
- Qual quadro, Afonso?
- Aquele assustador que está por cima da minha cabeça.
- Aquele és tu, filho! E estás lindo!
- Não estou nada... Pareço um zoombie. Se não tirares o quadro não consigo dormir.

(Mãe, sem paciência, esconde o quadro no gavetão da cama)

- Ó mami! Continuo sem dormir.
- Sabes o que é que a mãe faz quando não consegue adormecer? Penso num quadro branco e depois vou percorrendo os cantos, um a um, até me chegar o sono.
- E eu, sabes o que faço quando não consigo adormecer? Vou para a cama da mamã...

(Mãe, sem paciência, levanta-lhe o lençol. Eu sabia que não era boa ideia deixá-lo ver o Scary Movie hoje de manhã...)
(Mamã com pressa)
- Meninos, vamos embora!
(Nonô, 2 anos, a única princesa da casa)
- E as meninas, mamã?
- O meu outro filho não fazia assim, o meu outro filho não dizia assado...

Porque comparamos os filhos? Será essa uma forma de aprendermos a ser pais?
E quando o fazemos à frente deles? Será uma forma de os ensinarmos a ser filhos?

Se o assunto vos interessar, espreitem o segundo artigo que escrevi para o blog do Consultaclick.

http://consultaclick.pt/blog/2012/01/20/comparar-ou-nao-comparar-eis-a-questao/
- Meninos, prometam-me que se vão portar bem. POR FAVOR!
O aviso estava dado aos mais velhos, que, já com três meses de atraso, iam finalmente à consulta anual. Vinham excitados da escola, ainda não tinham levado o apertão habitual do final do dia para fazerem os trabalhos de casa e se comportarem à mesa e, assim que entraram no gabinete da pediatra, soltaram toda a palermice que ainda havia por gastar. Enquanto tentava manter a serenidade em frente à pediatra (que felizmente conhece melhor do que eu a idade da parvoíce), vi meias a voar, desfiles em cuecas e ouvidos moucos aos meus olhos arregalados (que soltaram berros).
Controlei a fúria até ao estacionamento das Amoreiras, onde lhes dei uma ensaboadela das antigas. "Desculpa, mami", "Desculpa, mãezinha", "Não tornamos a fazer", mas nos entretantos a pediatra deve ter respirado de alívio e pensado que ainda bem que as consultas nesta fase são só uma vez por ano... Já eu, não só respirei de alívio como prometi a mim mesma que, para o ano, levo o pai comigo (é que os olhos dele falam ainda mais alto!!)
Os gémeos e a disputa de sua mamã:

(Nonô, 2 anos, gémea menina)
- Nonô é da mamã, Dudu é da Lana (empregada ucraniana).
- Não. A mamã é dos dois.
- Na, na, na. Mamã Nonô, Nonô Mamã.

(Dudu, 2 anos, gémeo menino, a ver-me com a mana ao colo numa perna)
- Mamã, qu'ei colo.
(Mamã ergue-o para cima da sua perna livre)
- Não, mamã. Qu'ei colo dois.
- E a mamã tem os dois ao colo, Dudu. Os dois maninhos.
- Não! Dudu qu'ei colo dois pernas.
(Sebastião, 6 anos, após o banho)

- Ó mami, por que é que eu tenho o rabinho durinho, e tu tens o rabinho molinho?

Sem comentários, ok?
"Muita imaginação, mas é preciso atenção à pontuação".
Era mais ao menos isso que dizia na ficha de avaliação do meu filho mais velho (8), e que me fez sentir a pior mãe do mundo. É verdade que estou sempre a puxar pela imaginação dos meus filhos... mas como posso ter negligenciado a pontuação? Que espécie de mãe escritora sou eu?
Ontem, decidi sentar-me ao lado do meu filho para o ajudar na sua composição. Ele pegou no lápis para começar a escrever e eu mandei-o pousá-lo:
- O que é que vais escrever, Afonso?
- Uma história sobre os Reis Magos.
- Mas já sabes o princípio, o meio e o fim da tua história?
Não sabia, claro. Ia contar umas coisas. Então a obriguei-o a puxar pela cabeça. E a pensar no que queria dizer a quem o fosse ler.
- Ó mami, mas ninguém vai ler isto. Nem sei se a professora vai ter tempo!
- Não interessa, Afonso. Não estás a escrever para ti. Estás a escrever para que te leiam. Por isso tens de escrever sempre a melhor história que conseguires para aqueles que te poderão ler.
Ficou entusiasmado. E pegou novamente no lápis. Mandei-o pousá-lo novamente.
- Tens de pensar no teu arranque, Afonso. Se as tuas duas primeiras linhas forem uma seca, ninguém vai querer ler o resto. Nem a tua professora!
Pensou. E a história dos Reis Magos começou com uma noite fria em que estes andavam perdidos no deserto. Quando dei por ele, já tinha criado um quarto Rei Mago e já queria que ele partisse uma perna e vivesse uma aventura no castelo do HErodes. Tive de refreá-lo e pedir-lhe que guardasse a imaginação para histórias menos sagradas. Mas, mesmo com freio, ficou uma história bem construída, com princípio, meio e fim. E ele percebeu exactamente que tipo de erros cometia na pontuação.
- Há escritores que quase nao usam pontuação, nem separam as falas do texto, Afonso. Mas primeiro precisas de escrever correctamente. Depois logo podes criar um estilo próprio. E encontrar a tua própria originalidade.
- O que é isso, mami?
- É encontrares qualquer coisa que só tu faças. Para, quando os teus colegas lerem um texto teu, saberem logo que foste tu que o escreveste. Porque só tu escreverias assim.
- E qual é a tua originalidade, mamã?
- Bem... a mamã também ainda está à procura dela. Por isso ainda escrevo de forma muito certinha. Mas um dia vou encontrá-la... E tu vais encontrar a tua.
E ontem, perante uma nova composição, decidiu acabá-la com uma rima escrita no centro do texto.
- Posso fazer isto, mami?
- Podes. Vai ser a tua originalidade?
- Vai. Mas não podes copiá-la, mami!
Combinado, pequeno Afonso. E que a tua imaginação nunca te falte...
O meu filho mais velho (8 anos) anda completamente viciado na leitura! De manhã lê o Capitão Cuecas, aos intervalos lê o Principezinho, à noite lê o livro que requisitou na biblioteca. Nas aulas, despacha o que a professora pede aos alunos com rapidez para ler o livro que tem debaixo da mesa ("É para não ficar parado, mami. Antes isso do que me pôr a conversar, não achas?"), e os TPC também são feitos muito mais depressa para despachar mais um livrito ou dois.
Depois de três anos a julgar que não ia ter um grande leitor (mesmo depois de todo o investimento em livros e histórias de boa-noite), o meu escritorzinho em potência despertou finalmente para a leitura, e agora até me pergunto se não será demais. "Agora podes ir brincar, ok, Afonso?". "Mas eu estou a ler, mami..." E no outro dia um pai de um coleguinha veio dizer-me que se meteu com ele num intervalo, enquanto ele lia o seu livro, e que ele foi respondendo com monossílabos, forçando um sorriso para não ser antipático, mas com um nítido ar de "cala-te lá, pá, que eu estou a ler".
- E o que mais me impressionou - contava o pai - é que estava uma barulheira enorme, e ele conseguia concentrar-se.
Pois... digamos que, para ler livros numa casa com três irmãos mais pequenos, o meu filho foi obrigado a desenvolver capacidades especiais de concentração. O problema é conseguir que ele regresse à Terra antes de ler a última página...
(Afonso, 8 anos)
- Mami, podes contar a história aos manos, enquanto eu leio o meu livro no quarto?

Eu sabia que este dia chegaria... Custa, mas um dia eles têm de crescer, e preferir o seu momento sossegado de leitura à história atrapalhada contada pela mamã, tentando manter todos sentados enquanto se debate com diferentes vozes e gestos.

- Mas depois vais dar-me um beijinho de boa-noite?

Felizmente, não se perde tudo de uma vez...
Despachada a varicela cá em casa, voltámos à tranquilidade (dentro do género) e às histórias de boa noite, sem comichões nem birras febris. E voltou também a aula semanal de Filosofia para os mais velhos. Que talvez tenha que chamar antes de "aula semanal de criatividade", dada a loucura em que habitualmente ela termina. Hoje, o tema foi "Porque existimos". E, entre uma reflexão sobre a nossa espécie e o que ela cá anda a fazer, o Afonso recordou que veio de outro planeta depois de ter sido coroado herói. Foi trazido pelas vacas voadoras, que o fizeram descer nas suas tetas até à barriga da mamãe. O costume. O que me surpreendeu desta vez foi a história do Sebastião, que habitualmente fica calado, com dificuldade em acompanhar os delírios do irmão mais velho. Hoje, tinha uma história. E era bem boa!

- Eu decidi nascer porque tinha muita fome!
- Fome, Sebastião?
- Sim, nas nuvens só bebia água. E eu lá de cima via as pessoas a comer, a comer... Então resolvi nascer para comer muito.

E pronto. Ficou explicada a história do meu Anjinho Sebastião, e a razão do seu percentil 95 durante os primeiros 6 meses de vida...
A minha Nonôzinha, de 2 anos e meio, põe o colar da kitty, a pulseira das estrelas, a mala dos lápis cor-de-rosa ao ombro e o computador das princesas na outra mão. Vem ter comigo e diz:

- Mamã... Nonô igual à mamã, não é?

Não é de os comermos com beijinhos?