Tenho um único filho com orelhas "saídas". É o meu duendezinho Sebastião, que tem as bochechinhas mais apetitosas do universo. Quanto às orelhas, não sei o que lhes deu para se afastarem da cabeça, mas hoje dei por mim a pensar se a culpa não terá sido da minha gigantesca barriga cheia de líquido amniótico, e da natação que fiz até quase à véspera dele nascer. Com tanta água, dentro e fora da minha barriga, talvez o meu Sebastião tenha começado a desenvolver características que o aproximam de uma espécie de "Homem da Atlântida" (sim, eu sou do tempo dessa mítica série!).
Não, o meu filho não tem orelhas saídas. Tem barbatanas ligadas à cabeça por membranas aquáticas! O Sebastião ainda não sabe nadar, mas talvez no dia em que aprender ele desapareça 5 minutos debaixo de água e reapareça depois, com aquele seu sorriso irresistível, a soltar um pirolito de água: "Então, não vêm?"
Depois de ler um livro aos meus filhos sobre Sentimentos (ao Afonso, ao Sebastião e à Leonor, porque o Duarte continua a ir dormir às 8 da noite, e a perder grande parte da paródia que se segue ao jantar), comecei a fazer-lhes perguntas difíceis: O que se sentia quando tínhamos vergonha, onde nos doía quando estávamos tristes, onde é que ficava guardada a inveja...
Até que, a dada altura, resolvi perguntar-lhes:
- E vocês sabem o que é que se sente quando ficamos apaixonados?
Responde-me logo o Afonso (7 anos), prontamente:
- Eu sei! Sente-se a pilinha a crescer e a levantar-se...
Definitivamente, há sentimentos que os homens não guardam só no coração...

PS - Aulas de Sexualidade precisam-se, pf.
Se os meus filhos um dia pertencerão à Geração Rasca, à Geração À Rasca ou à Geração Carrasca, não sei bem. Mas sei que pertencerão, pelo menos, à Geração da Reciclagem, da boa Nutrição e do Não ao Tabaco. Volta e meia, lá entram em campanha e massacram o pai que, por ter nascido noutra Geração, deixou-se viciar em tabaco na adolescência. Ontem, o Afonso (filho mais velho) resolveu ter uma conversa séria comigo:
- Ó mãe, nós temos que pensar em alguma coisa para fazer o pai deixar de fumar.
- Não é fácil, filho...
- Temos que pensar num plano...
E deixou-se ficar em silêncio, pensativo, até o pai s juntar a nós.
- Ó pai... já sabes o que é que vai ser o teu jejum nesta Quaresma?
Ao ouvir falar em jejum, na Catequese, o Afonso decidiu propor ao pai que, em vez de comida, abdicasse do tabaco! Era bom que fosse assim tão simples. Mas foi uma boa tentativa...
A escrever sobre o Futuro, decidi pedir umas ideias ao meu filho Afonso (7), cuja imaginação consegue sempre surpreender-me. E esta vez não foi excepção:

(Mãe)
Afonso, se fosses ao Futuro, o que é que encontravas?
(Afonso)
Dinossauros.
(Mãe)
Dinossauros? Isso não é no Passado?
(Afonso)
No futuro também. Criaram um vírus informático que fez com que os Dinossauros do meu Jogo de Computador ganhassem vida.

Definitivamente, isto é muito à frente para mim. Vou mas é escrever para os adultos, antes de ser chamada de "cota"...
(Afonso a caminho da cama)
- Ó mãe, o primo Zé Maria diz que o Pai Natal não existe... e que é o Jesus que entrega os presentes aos pais, para eles os darem no Natal.
- Mas tu afinal acreditas no Pai Natal?
- Não. Nem acredito no Jesus. Como é que ele podia dar os presentes aos pais, se ele está morto?
- Está morto, filho?
- Claro! O Natal é em Dezembro, e ele só ressuscita em Março, na Páscoa...

Pois...
Diácono Rodrigues, importa-se de ter uma conversinha com o seu neto?
Um sol esplendoroso. 4 filhos enfiados em casa a fazer disparates. Mila de fim-de-semana de folga. A casa de pantanas. A mãe aflita com trabalho. Disse "Basta!" às 11 da manhã, e convenci o pai, que acordara coxo, a ir pelo menos a qualquer lado. A qualquer um. Podíamos nem sair do carro...
Metemos todos no carro, deixámos o cão a fazer mais uns cocós e xixis pela cozinha, e aí fomos nós. Uma rotunda, duas... vomita o Duarte. Três rotundas, quatro... vomita a Leonor. Com um cheiro indescritível no carro, e o Afonso e o Sebastião já quase também a vomitar, voltámos para casa. Onde o cão nos esperava depois de 2 cocós e 3 xixis. Que bela manhã...
Enquanto limpava os cocós e xixis do cão, e dava banho aos gémeos, lembrei-me de uma outra manhã, igualmente linda, que me aconteceu há uns anos. Ainda só tinha o Afonso e o Sebastião, que era bebé. Íamos ao casamento de dois grandes amigos meus, no Alentejo profundo, e eu ia tocar a Avé Maria da entrada. Tinha passado a semana a ensaiar sozinha, mas era suposto chegar mais cedo à Igreja para ensaiar ainda com a rapariga que ia cantar. Claro que saí de casa atrasada. Já não me lembro exactamente porquê, mas metia certamente roupinhas, e cadeirinhas, e xixis, e birras... Chegámos à ponte 25 de Abril e estava tudo parado. Stress! Um calor de morte, e os miúdos já a resmungar. O atraso a acumular. Quando passámos a fase crítica, pedi ao meu marido para pôr o pé no acelerador. A cantora já estava à minha espera, e eu ainda estava a 100 e tal quilómetros! Até Montemor fomos lindamente, prego a fundo. O problema foi depois. Metemo-nos por atalhos para tentar chegar mais depressa, perdemo-nos e, entre as curvas e contra-curvas, o Sebastião vomitou. Depois foi o Afonso. Eu chorava. E a noiva a esturricar dentro do carro, às voltas, à espera que eu chegasse... E eu não cheguei. A horas, não. A noiva entrou. A cantora cantou à capela. Eu entrei de maquilhagem esborratada, de chorar. E, enquanto via a minha amiga noiva dizer o Sim ao meu amigo noivo, e pensava para comigo que aqueles dois já deviam ser tudo menos meus amigos, o meu marido andava pelo jardim que havia em frente à Igreja, com um filho em cuecas e outro de fralda, enquanto as suas roupinhas pipis secavam em cima de uma sebe...
Ter filhos é maravilhoso. Mas ele há dias e dias...
Depois de uma dia intenso de filhos e sobrinhos, daqueles que parece que nunca mais acabam, mas que, depois de acabarem, nos deixam umas saudades imensas, resolvi desafiar o meu filho Afonso para uma meia-hora musical. O meu filho tem sempre preguiça de estudar guitarra, mas quando o acompanho ao piano, nunca se nega. Claro que a façanha só pode acontecer ao fim-de-semana, porque durante a semana o tempo mal chega para os TPCs, os banhos, os jantares e a história. Quando chega a hora da guitarra já os manos bebés estão na cama, e o piano não é, definitivamente, o melhor instrumento para adormecer gémeos. Mas de vez em quando, ao Domingo, lá arranjamos um buraquinho para o concerto, e como as músicas dele são cada vez mais elaboradas, também o são os seus acompanhamentos, e hoje soou-me mesmo bem a nossa comunhão musical. O Sebastião juntou-se a ouvir, e até os gémeos ficaram mais calminhos. Esqueci as birras deles, as más-educações, os vícios da playstation, as preguiças, os gritos e as correrias. Esqueci as minhas faltas de paciência, os meus gritos, o meu vício no trabalho e as minhas pressas. Senti-me a mãe perfeita da família perfeita, qual Von Trapp. Claro que só durou meia-hora. Depois o Afonso já estava fatigado, era hora de jantar, o cão já tinha feito mais um cocó na sala e o pai queria ouvir o futebol. Mas pronto. Se todos os dias tivermos meia-hora de Música no Coração, já teremos direito a um Óscar...
Como se não bastassem os 2 mais velhos e os gémeos, agora temos um pequeno cachorro cá em casa. Sempre disse que gostava de ter mais um filho, mas não estava nos meus planos uma pequena bola de pêlo que despeja cocó e xixi por onde quer que passe. É lindo, fofo, só dá vontade de apertar, mas de repente as xuxas que caíam no chão correm o risco de cair em cima do xixi que ainda não limpámos, as mãos sapudas dos gémeos que mexem em tudo aquilo que alcançam, correm agora um risco acrescido de se embodegarem nos cocós escondidos nos mais recônditos recantos da nossa casa. E, se os meus gémeos já comiam a comida do chão, agora também se lambuzam com a ração do cão e a água que está junto à caminha do cachorro. É mais um bebé cá em casa, para chorar de noite e exigir dois olhos atrás dele. Mas quem resiste a ver 4 crianças doidas com um pequeno cãozinho, esquecendo desenhos animados e playstations?
A afortunada cachorra (se resistir aos apertões e puxões de orelhas dos gémeos) chama-se Cuca, porque das poucas palavras que os meus filhos bebés dizem é "Uca". Assim "Uca" dá para Ruca e dá para Cuca. Economia das palavras. Temos de nos valer de tudo em tempos de crise...
- Ó mãe, se o mano sem querer deixar cair a mana e ela morrer o que é que fazes?
(Mãe ignora)
- Ó mãe, diz lá... se o Sebastião puser a mana ao colo e sem querer a deixar cair pelas escadas abaixo e ela morrer, o que é que tu fazes?
- Afonso... por favor!
- E se for a Mila? Se a for a Mila a matar a mana o que é que tu fazes?

Raios parta o miúdo! Com tanta coisa para herdar de mim, logo tinha que ficar com a projecção da desgraça. Lá acabará a escrever novelas...
Depois de uma ida (atribulada) ao concerto para bebés com os filhos mais novos, levei os mais velhos a ver os Deolinda. Eles conhecem grande parte das músicas, sabem algumas das letras de cor, e achei que seria boa ideia levá-los pela primeira vez a um concerto "a sério". Com o senão de que os concertos "a sério" começam à hora a que eles habitualmente já estão deitados. Resultado: o Sebastião durou 4 músicas. Afonso durou mais umas quantas, mas porque o Pai se lembrou de dizer que no final caíam confetis do tecto e ele queria assistir. Lá chegará o tempo em que eles vão querer ir aos concertos todos e eu vou querer ir atrás (já me imagino aos moches no meio de um estádio qualquer, ou às cavalitas deles, que vão crescer muito mais do que eu...). E também lá chegará o tempo em que eles não vão querer que eu vá atrás deles. Mas, por enquanto, vamos deixar-nos de concertos "a sério" e ficarmo-nos pelos Festivais do Panda e matinés ao Domingo...
E pronto. É isto que os pais sentem quando os professores os mandam chamar e dizem que o filho anda esquisito, a portar-se mal, aéreo e com chamadas de atenção. Os pais estiverem 4 dias no bem bom, deixaram os filhos com os avós para irem dormir e comer à grande e à francesa, sem gritos, nem confusões, nem choros, nem birras, nem fraldas, nem horários, nem TPCs, nem Pandas, nem pesadelos a meio da noite, e quando voltam ouvem estas coisas. E sentem-se mal. Muito mal. E pensam que não deviam ter ido... mas soube-lhes tão bem! Fazia-lhes tanta falta. E eles vieram de lá tão descansadinhos da vida, com os sonos em dia e saudades dos filhotes...
Ser pai é viver neste dilema de termos filhos, mas termos de pensar que eles não são só nossos, e nós não somos só deles, e por isso culpamo-nos quando vivemos demasiado para eles, mas também quando resolvemos pensar um bocadinho em nós.
No caso do Sebastião (o filho em causa, que anda a chamar a atenção), existe um problema acrescido, que não é destes dias, é de sempre. O Sebastião é o "entalado" dos irmãos, aquele que, em virtude de ter nascido no meio e ser um bonzão, nunca ter dado trabalho nenhum, sempre foi aquele com que menos nos preocupávamos. Na fase dos "2", o Afonso ia sempre à frente, foi ele a fazer as primeiras gracinhas, a dizer as primeiras palavras, a fazer as primeiras observações engraçadas, a descobrir as letras, e os números, a entrar na Primária... O Sebastião perdeu a vez da "primeira vez". Já tínhamos assistido às suas novidades, e a nossa reacção foi muitas vezes de "mais uma vez" do que "primeira vez". Com todo o amor do mundo. Mas indisfarçadamente menos surpresa.
Depois começou a fase dos "4". E o Sebastião teve que fazer parelha com o irmão mais velho, porque a mãe estava demasiado ocupada com os irmãos bebés. E, sempre que a mãe conseguia tempo para a "dupla" mais velha, era para dar atenção ao Afonso, por causa dos TPC, das suas exigências, da sua ininterrupta conversa, das suas permanentes negociações, das suas agitações. O Sebastião, pacholas, sempre ficou com os restinhos da mãe. De que lhe tem valido, afinal, ser bonzinho e paciente? Pois que agora começou a dar sinais de impaciência. Talvez estas chamadas de atenção sejam para reivindicar o seu lugar. E com justa causa. Por isso desde hoje que há novas medidas cá em casa:
- À hora dos TPC do Afonso, a mãe faz também uma ficha ou um jogo com o Sebastião (que assim não fica por casa esquecido até à hora do banho e do jantar)
- A escolha dos livros que lemos à noite é alternada, uma noite é o Afonso, na outra o Sebastião (já era assim há umas semanas, mas o Afonso acabava sempre por escolher pelo Sebastião, cujo poder de decisão deixa muito a desejar)
- Os programas do fim-de-semana também vão ser à vez.
- Sempre que o Afonso tiver festas de anos, em vez da mãe aproveitar para trabalhar, vai fazer um programita com o Sebastião.
E pronto. Vamos ver como corre. O problema vai ser quando os gémeos também começarem a chamar a atenção... Inventem-se pais com mais braços e dias com mais horas, por favor!
Este ano os nossos filhos mais velhos foram votar com os pais. Como eu e o pai votávamos em locais diferentes, o Afonso (mais velho) foi com o pai, e o Sebastião (do meio) foi comigo. No caminho, o Pai explicou ao Afonso como decorriam as eleições. Como eram as campanhas, como se votava, como se contavam os votos e o que acontecia ao vencedor e ao vencido. E o Afonso aconselhou o Pai a votar no "Sovaco Silva". Porquê? Porque era o único que conhecia... (e não terá sido por isso que ele teve tantos votos?)
Já eu, que tinha passado o fim-de-semana a trabalhar e estava sem vontade alguma de votar, pedi ajuda ao Sebastião para me escolher um candidato.
- Quais é que são os candidatos, mãe?
- Então... há o Cavaco Silva, que quer que o país seja mais rico. Depois há o Manuel Alegre, que quer que o país seja mais...
- Alegre!
- Isso, Sebastião. E há o Fernando Nobre que quer que o país seja mais...
- Nobre!
- Sim. Pode ser. Os outros... a mãe não se lembra dos nomes. (eu sei, eu sei! Pouco zelosa da sua responsabilidade cívica. Mas a minha capacidade de memória, com tanta personagem e cliente e crianças na escola, está no seu limite. Sem um disco externo não consigo guardar nem mais um nome!)
- Ó mãe... e como é que vai ser? Os candidatos vão pôr-se todos alinhados e eu depois aponto?
- Não, filho... Eles não vão estar lá. Tens que escolher pelas fotografias.
- Ah... Mas eu já sei qual é que vou escolher.
- E qual é, Sebastião?
- Aquele primeiro que tu disseste. Se o país ficar mais rico tu podes comprar mais beyblades...
E pronto. Perante a minha fraca abordagem dos candidatos, ele até fez uma escolha acertada...
E quando os filhos chegam com as suas mãozinhas sapudas e carregam com força no teclado do nosso computador, onde estava aberto um trabalho importantíssimo? O documento desaparece do ecrã. E depois saber em que teclas eles teclaram? E quando o documento tem 200 páginas que vamos ter que rever novamente?
Há dias em que ser mãe é um verdadeiro teste à nossa paciência...
Tive uma vez um cão que não sabia alçar a perna para libertar as suas necessidades líquidas. A sua companhia, lá em casa, era uma velha cadela que baixava a parte traseira com delicadeza, sem sujar qualquer parede, tronco, poste ou pneu. E assim esse cão, que se chamava Arco-Íris mas era preto, não tinha um macho por perto para lhe explicar que os cães, dizem que por uma questão de dominação, levantam a pata e sujam o território ao nível do dorso. E ele fazia como via. Com delicadeza. Nos cantinhos da quinta.
Pois a minha Leonor, quando vê os irmãos mais velhos abeirarem-se da sanita e puxarem as pilinhas para fora para fazer o último xixi do dia, aproxima-se também ela da sanita, levanta o robe e empurra o corpo para a frente. E faz xxxxxxx... Talvez esteja na hora de começar a levá-la comigo à casa de banho para ela perceber que existem outras opções mais confortáveis à sua anatomia... Ou talvez desviar-lhe a atenção quando os irmãos estão de calcinhas em baixo. Mas também acho que não se deve limitar a curiosidade natural das crianças... Também já dei por ela, uma vez que estavam todos nus, prestes a entrar na banheira, a procurar no seu corpinho um pendericalho semelhante aos dos irmãos...
As diferenças de género, nela, psicologicamente, são evidentes. Ela é arrumadinha, senta-se direitinha, adora vestir-se e calçar-se, e pentear-se, e andar com malinhas e pulseiras e colares. Só ainda não percebeu que as diferenças também são físicas, e cada dia que passa se tornarão mais evidentes. E lá chegará o dia em que já não os terei todos nus a enfiarem-se na banheira ou a fazerem xixi ao mesmo tempo...
Afonso, 7 anos. Já deitado na cama e mãe a tapá-lo, com a cabeça já a pensar no trabalho que ainda tem para fazer antes de ir dormir.


- Ó mãe, existem minotauros?
- Não, filho. Já viste algum?
- Ó mami, e existem fantasmas?
- Não, filho. Já viste algum?
- Ó mami, e existem deuses da água, da terra, do ar e do fogo.
- Não, filho. Já viste algum?
- Mas se Deus existe, e também ainda ninguém o viu, porque é que os minotauros, os fantasmas e os deuses também não podem existir?

Pois...
(Mamã) Ca-fé
(Dudu) Lo-mó
(Nocas) Co-qué
(Mamã) No-dy
(Dudu) Mo-mé
(Nocas) No-ni
(Mamã) Sa-pa-to
(Dudu) Ta-ta-ta
(Nocas) Ta-ta-to
E é assim o dia todo. Os gémeos adoram brincar às sílabas, mas as letras fogem-lhes da língua, saltitam e trocam-se umas às outras para resultarem noutras palavras que ninguém entende. Talvez as letras não queiram que os adultos entendam as crianças. Queiram que as crianças fiquem só delas, e dão-se-lhes para que elas criem a sua própria linguagem. Mas se elas tentam ir ao encontro da língua dos adultos... ficam furiosas e saltam no palato, penduram-se no sininho e rebolam na língua para saírem do sítio certo... Até um dia se cansarem (ou talvez crescerem também, como os meninos que as dizem) e decidirem render-se à linguagem dos homens. Dão as mãos e saem direitinhas pela boca, duas a duas, três a três ou quatro a quatro, como meninas e meninos da escola, para toda a gente as entender.

PS - Nunca aprofundei o assunto, mas acho curioso que haja crianças que primeiro conseguem acertar no som, e outras que comecem por acertar o ritmo. O meu Sebastião dizia a primeira sílaba de tudo, mas "comia" o resto. Os gémeos acertam na quantidade de sílabas, mas falham os sons. A Nocas, no entanto, já deu um passo à frente, e já consegue acertar no último som das palavras, e muitas vezes também na primeira letra. O Duarte ainda só vai no ritmo, mas está bem provado, cá em casa, que as miúdas são mais despachadinhas...
Agora também digamos que nós cá em casa não lhes facilitamos a vida... é que todos nós temos pelo menos 4 nomes pelos quais somos chamados:
PAI:
- Pai
- Papá
- Papi
- Pedro

MÃE:
- Mãe
- Mamã
- Mami
- Sara

AFONSO:
- Afonso
- Fonseto
- Fonfas
- Filho
- Mano

SEBASTIÃO:
- Sebastião
- Titão
- Titaneco
- Sebastian
- Filho
- Mano

DUARTE:
- Duarte
- Dudu
- Duduski
- Duqui
- Filho
- Mano

LEONOR:
- Leonor
- Nocas
- Nonô
- Nonoski
- Noqui
- Filha
- Mana

Coitadas das crianças... Se calhar o que as letras pensam é que nós, os seres falantes, somos MUITO complicados!
Porque é que os adultos, quando acordam, ficam de meter medo ao susto, e as crianças, ao acordar, ficam deliciosas? Capazes de as mordermos ou cobrirmos de beijos?
Será das bochechas?
Dos olhinhos sem rugas?
Dos sonhos sem pesadelos?
Quando vou buscar os meus filhos ao quarto, de manhã, abraço-os e lambuzo-os e não consigo não desejar que eles fiquem sempre pequeninos... (na maior parte do restante tempo, desejo que eles cresçam e deixem de fazer birras, de usar fraldas, de ter de comer a horas, de se sujarem, de mexerem em tudo, de não terem noção do perigo, de terem de levar vacinas, de vomitarem tantas vezes... uff! O problema é que, quando estas coisas todas acabarem, vai bater aquela saudade...)
Com o pai a trabalhar e corte de electricidade em casa, resolvi pegar nas tropas e rumar ao Oceanário. Desde que a Leonor aprendeu a dizer "Petche" que eu andava com vontade de lá ir. E hoje não pensei duas vezes. "Saíste mesmo com os 4??" - perguntava o Pai ao telefone. E, já na bilheteira do Oceanário, foi a vez da Funcionária se surpreender: "Vai mesmo entrar sozinha com eles todos??". O Afonso fez-se logo ouvir e argumentou que ele era um excelente condutor do carro da irmã. Saltou logo o Sebastião a dizer que quem levava a mana era ele (e ele continua a querer tudo o que o irmão quer! Maldito síndrome de irmão mais novo, que neste caso é do meio). E estive quase tentada a deixar que fossem eles os 2 a levar os irmãos, enquanto eu descansadamente via os peixinhos. Não ia durar muito tempo... aliás, nem a disputa pela irmã durou, porque os peixinhos falaram mais alto e eles passaram a disputar foi a máquina fotográfica e a descoberta do peixinho mais belo.
Balanço da manhã:
- A Leonor gritou uma centena de vezes "Petche" e o Duarte outras tantas vezes "Pê".
- Fomos repreendidos por comer bolachas e Bolycaos no Oceanário (mas quem suporta ouvir os filhos reclamar por comida?)
- Tirámos dezenas de fotos (sem flash, ok?). 90% delas são borrões negros ou imagens desfocadas.
- No final comprámos lembranças. Um kit ciência para o Afonso, um dinossauro para montar para o Sebastião, uma raia para a Leonor e um lagarto para o Duarte (embora ele, num momento de distracção minha, tenha mordido e enchido de baba todas as tartarugas de peluche que apanhou. Eu, como boa e tesa mãe, fingi que não vi e segui caminho)

Amanhã é dia de Concerto para bebés em Sintra. OS miúdos vão ficar esgotados com tanto programa... e a mãe deles idem idem aspas aspas!
Quando chego a casa mais tarde, já com a criançada toda por lá, sinto-me a verdadeira mãe-pássara, que chega com as minhocas (uma ou outra coisa que comprei para eles, que mais não seja comida já pronta para o jantar) e tem de escolher quem alimentar primeiro. Os meus filhotes abrem o bico e correm para mim à procura de algo. Debicam-me de alto a baixo, e em vez de Pius oiço "Mamã, mamã, mamã, mamã". E, assim como a Mãe Pássara se deve perguntar quem há-de alimentar primeiro (como escolher? O bico maior? O mais frágil? O que pia mais?), eu pergunto-me quem pegar primeiro ao colo, quem beijar primeiro, a quem dar miminhos e a quem perguntar primeiro como correu o dia. Independentemente da minha escolha (que normalmente se baseia em quem é mais ágil para trepar por mim acima, ou quem grita mais alto por atenção) fico sempre com vontade de ter mais braços, e mais bocas e mais colos e mais beijinhos para dar ao mesmo tempo. E ainda há que arranjar em um espacinho (de tempo, de corpo, de atenção) para o passarão...
O meu Sebastião teve um pesadelo esta noite. Acordou a chorar e gritou por mim, ainda atordoado com as imagens que o assustaram a dormir.

- Ó mãe... não existem fantasmas, pois não?
- Não, Sebastião... Dorme descansado.
- Ó mãe... e não existem ladrões, pois não?
- Aqui não, Sebastião. Dorme descansado.
- Ó mãe... e não existem mexicanos, pois não?

Ri-me a nachos. Então agora os mexicanos também causam pesadelos? Tive que lhe dizer que não. Homens de chapéu grande e colchas às costas, só mesmo nos piores sonhos das crianças...